Direito de Arena: entenda como funciona
No Brasil, o Direito de Arena propriamente dito foi introduzido no ordenamento jurídico com o surgimento da Lei n°.5.988/73
O vocábulo “arena”, que advém do latim, significa areia, utilizado no âmbito desportivo, desde a antiguidade, como local coberto de areia em que os gladiadores romanos combatiam
O vocábulo “arena”, que advém do latim, significa areia, utilizado no âmbito desportivo, desde a antiguidade, como local coberto de areia em que os gladiadores romanos combatiam entre si ou com animais. Naquela época, todos iam à arena assistir o espetáculo[1] (Zainaghi, 1998).
No Brasil, o Direito de Arena propriamente dito foi introduzido no ordenamento jurídico com o surgimento da Lei n°. 5.988/73, que regula os direitos autorais. Antes de sua criação, os clubes nada recebiam pelas imagens geradas em razão do espetáculo esportivo, que eram transmitidos pelos meios de comunicações a toda coletividade de forma gratuita.
Dia o artigo 100 de referida lei.
“Art. 100. A entidade a que esteja vinculado o atleta, pertence o direito de autorizar, ou proibir, a fixação, transmissão ou retransmissão, por quaisquer meios ou processos de espetáculo desportivo público, com entrada paga.
Parágrafo único. Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço da autorização serão distribuídos, em partes iguais, aos atletas participantes do espetáculo”.
Antonio Chave, coautor do projeto de lei que originou a lei acima citada afirmou, por diversas vezes, que tal lei não era a mais adequada para tutelar o direito de arena, porém, sempre ponderava que o desempenho dos grandes atletas aproximava-se ao de verdadeiras artistas.
A grande dúvida que se tinha era se o atleta poderia ser comparado ou equiparado ao artista.
O próprio Antonio Chaves afirmava que “os profissionais indicados, e outros ainda que possam ser acrescidos ao rol meramente exemplificativo da lei, mas que revelam, na sua atuação, dotes criadores que personalizem a sua inspiração” (Chaves, 1999).[2]
Eduardo Augusto Viana da Silva afirmava que “não foge ao sentido a analogia formulada entre jogador de futebol e o artista, embora, em nossa opinião, não possa o atleta ser comparado em igualdade de condições profissionais ao artista, pois sua atividade está mais voltada para a competição, par a aprova, do que para o espetáculo, na essência do seu significado. Apesar disso, no imaginário social, a posição de ambos não se distancia tanto” (Silva, 2006)[3].
E o grande mestre, Álvaro Melo Filho responde à pergunta com brilhantismo, ao afirmar que “ao dar guarida, no cotexto constitucional, ao direito de arena nas atividades desportivas, o legislador constituinte demonstrou conhecimento e sensibilidade pois, atualmente, não se pode olvidar que os estádios foram transformados em estúdios, pro fava das modernas técnicas de difusão e de redução do mundo dispositivo a uma aldeia global” (Filho, 1995)[4].
Com a promulgação da Constituição Federal, em 1.988, ficou assegurada em seu artigo 5º, inciso XXVIII, alínea “a”: “a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução de imagem e voz humana, inclusive nas atividades desportivas”.
Nota-se que o legislador constituinte preocupou-se em garantir a proteção às participações individuais em obra coletiva, ou seja, do atleta na partida de futebol.
Todavia, no âmbito do direito desportivo, o Direito de Arena passou a ser tutelado somente com a criação da Lei nº. 8.672/93 (Lei Zico, então Ministro dos Esportes).
O texto original trazia o seguinte, em seu artigo 24:
“Art. 24. Às entidades de prática desportiva pertence o direito de autorizar a fixação, transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo desportivo de que participem.
§1º Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço da autorização serão distribuídos, em partes iguais, aos atletas participantes do espetáculo”.
Com a revogação da Lei Zico pela Lei Pelé (Lei nº 9.615/98), o Direito de Arena, aplicado ao Direito Desportivo, passou a ser regido pelo artigo 42 da Lei Pelé, segundo o qual:
“Art. 42 – Às entidades de prática desportiva pertence o direito de negociar, autorizar e proibir a fixação, a transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo ou eventos desportivos de que participem.
§ 1. Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço total da autorização, como mínimo, será distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo ou evento”.
Aqui vale a pena fazer um parênteses para destacar que o legislador se preocupou em acrescentar a expressão como mínimo no texto legal atual, justamente para assegurar que eventual convenção em contrário não reduzisse o patamar de 20% (vinte por cento), estipulado por lei.
No cenário brasileiro, mesmo com o acréscimo da expressão “como mínimo” contido no texto de lei, alguns sindicatos de atletas profissionais (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul) firmaram, no ano de 2000, um famigerado acordo, não qual ficou previsto uma redução do patamar mínimo de 20% (vinte por cento), para 5% (cinco por cento), em patente violação a diretos e garantia de trabalhadores.
Como não poderia deixar de ser, referido acordo foi considerado um absurdo e diversos atletas passaram a ingressar com ações individuais na Justiça do Trabalho, pleiteando o pagamento da diferença de 5% (cinco pro cento) que era efetivamente pago, para 20% (vinte por cento), percentual mínimo estipulado em lei.
Denota-se, do texto legal, que o Direito de Arena é um direito conferido às Entidades de Prática Desportiva (Clubes) de negociar a transmissão ou retransmissão da imagem coletiva do espetáculo esportivo, de qualquer evento de que participe sua equipe, com a exceção dos flagrantes para fins jornalísticos, cabendo ao atleta, apenas, o direito a um percentual, previsto em lei, sobre o valor total negociado.
Isso se dá por uma simples razão. O atleta acaba sendo o protagonista maior do evento desportivo, aquele que possibilita a negociação em valores elevados pela entidade de prática desportiva – haja vista, por exemplo, a repercussão do próprio Ronaldo no Corinthians, sendo que a legislação tomou o cuidado de assegurar ao atleta parte desse valor, ou seja, o mínimo de 20% (vinte por cento).
Com os craques, os clubes conseguem negociar cotas de televisão mais elevadas, razão pela qual é significante que os atletas sejam beneficiados, pois são eles os grandes protagonistas do evento esportivo. São aqueles que realmente motivam a transmissão das partidas.
Direito de Imagem x Direito de Arena:
Importante aqui fazer uma observação para esclarecer qual a diferença entre Direito de Arena e Direito de Imagem, habitualmente confundidos pelos não operadores do direito, mormente o desportivo.
O Direito de Imagem é o nome doutrinariamente atribuído ao direito exclusivo do indivíduo permitir a utilização de sua imagem, esta compreendida como forma física exterior do corpo, inteiro ou parte dele.
Já o Direito de Arena refere-se ao direito autoral, ou seja, o autor da imagem, como por exemplo, uma partida de futebol (obra coletiva).
Aliás, no Direito de Arena, a titularidade é da entidade de prática desportiva, devidos em razão da efetiva participação no espetáculo desportivo, ao passo que nos contratos de licença de uso de imagem a titularidade pertence ao atleta, devido por conta da utilização da sua imagem agregada a determinado produto, veiculando e explorando em merchandising comerciais, a fim de conferir valor agregado a bens de consumo.
Essa diferenciação ficou muito clara quando o Egrégio Superior Tribunal de Justiça julgou o famoso caso do álbum de figurinhas dos “heróis do Tri”, processo no qual os jogadores que ganharam a Copa do Mundo de 1.970 pleitearam indenização da Editora Abril S.A. e da Confederação Brasileira de Futebol por uso indevido da imagem:
“EMENTA: direito à imagem. Direito de arena. Jogador de futebol. Álbum de figurinha.
O direito de arena que a lei atribui às entidades esportivas limita-se à fixação, transmissão e retransmissão do espetáculo desportivo público, mas não compreende o uso da imagem dos jogadores Dora da situação específica do espetáculo, como na reprodução de fotografias para compor “álbum de figurinha”. Lei nº 5.989/1973, art. 100; Lei nº 8.672/1993”[5]
Da Natureza Jurídica do Direito de Arena:
Está é uma das grandes discussões quando se fala em direito de arena no território brasileiro.
Duas são as correntes acerca da natureza jurídica do instituto, sendo que a primeira entende ser uma verba de natureza indenizatória e a segunda remuneratória.
Os que entendem ser uma verba de natureza indenizatória, como Felipe Legrazie Ezabella e Luiz Felipe Guimarães Santoro, por exemplo, sustentam a tese de que o valor auferido a título de direito de imagem não advém da relação empregatícia, mas sim da exposição, com fins econômicos, do espetáculo esportivo.
Entretanto, em que pese o brilhantismo dos ilustres juristas, não se pode atribuir ao direito de arena a natureza indenizatória, mesmo porque, se assim o fosse, os jogadores que estão no banco de reservas deveriam fazer jus ao recebimento do percentual estipulado em lei, pois também possuem sua imagem explorada. Maior exemplo disso foi quando da estréia do atacante Ronaldo, pelo Corinthians, que mesmo do banco de reservas, teve sua imagem reproduzida o tempo todo e, se não entrasse em campo, não seria indenizado.
A segunda corrente entende que o Direito de Arena possuí natureza jurídica de remuneração, equiparando-se a gorjeta, ante ao fato de serem pagas por terceiro.
Tanto é assim que, nos termos do parágrafo 1º, do artigo 42, da Lei nº 9.615/98, referido pagamento só será realizado aos atletas profissionais participantes do espetáculo desportivo.
Segundo o Ilustre Professor Domingos Sávio Zainaghi diz que “a natureza jurídica do direito de arena no campo do direito do trabalho é o de remuneração“[6].
A tese é defendida quando traçado um paralelo com o instituto jurídico da gorjeta, previsto no artigo 457 da Consolidação das Leis do Trabalho, que assim dispõe:
“Art. 457 – Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contra prestação do serviço, as gorjetas que receber.
Parágrafo terceiro: Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à distribuição aos empregados”.
Até é pertinente trazer uma decisão sobre o tema, para que não pairem dúvidas acerca da matéria:
“DO DIREITO DE ARENA. NATUREZA JURÍDICA. INTEGRAÇÃO AO SALÁRIO. Sendo o direito de arena resultante da participação dos atletas profissionais sobre o valor negociado pela entidade desportiva com órgãos responsáveis pela transmissão e retransmissão de imagens, o valor percebido, vale dizer, condicionado à participação no evento, resulta da contraprestação por este ato, decorrente da relação empregatícia, possuindo, então, natureza jurídica de salário, nos termos dos artigos 459 da CLT c/c 42, § 1º, da Lei nº 9.615/98. Inexistem ofensas às normas dos artigos 5º, II e XXVIII, da CF/88 e 214 do Decreto nº 3.048/99. Agravo improvido”[7].
Seguindo essa linha de raciocínio, no sentido de que o Direito de Arena tem natureza jurídica de remuneração, pode-se trazer a comparação aos pagamentos realizados aos trabalhadores a título de gorjetas, uma vez que, nos termos da lei, tudo aquilo que o empregado vier a receber, direta ou indiretamente, do empregador ou de terceiros, em virtude da existência do contrato de trabalho, constitui remuneração.
Pois bem, em razão da similaridade do Direito de Arena com as gorjetas, que igualmente são pagas por terceiros e não diretamente pelo empregador, pode-se afirmar, taxativamente, que referido pagamento integra a remuneração do atleta, e deverá refletir em todo o Contrato de Trabalho, tais como: 13° salário, férias acrescidas do terço constitucional, FGTS e INSS.
Cálculo do Direito de Arena:
Esclarecimentos feitos, compete agora mostrar qual é a fórmula para se apurar os valores devidos aos atletas. Para tanto, usaremos valores hipotéticos.
Suponhamos que um determinado clube receba R$ 700.000,00 (setecentos mil reais) para a disputa de determinado campeonato, disputado em 10 rodadas, ou seja, cada clube fará apenas 10 partidas no campeonato.
Os 20% (vinte por cento) estipulados em lei que deverão ser repassados aos atletas deverão corresponder a R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais). Para saber quanto cada jogador receberá por jogo, devemos dividir esse valor pelo número de jogos (10) e depois dividir pelo número de jogadores que efetivamente participaram da partida (consideraremos aqui que o clube realizou as 03 substituições em todos os jogos, sendo que 14 jogadores participaram efetivamente da partida).
Realizando as operações, chegaremos ao valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais), ou seja, cada jogador que tenha participado do jogo receberá esse valor, por partida. Para chegar ao valor que o atleta faz jus no campeonato, basta multiplicar esse valor pelo número de jogos que o atleta participou.
Pagamento Realizado na Prática (5%) ou na Teoria (20%)?:
Sendo o assunto tão simples assim, qual é a razão dessa enxurrada de processos judiciais acerca da matéria?
Mesmo existindo previsão legal desde 1.993, conforme exposto, garantindo aos atletas participantes do evento desportivo um mínimo de 20% (vinte por cento) sobre o valor total negociado entre a Entidade de Prática Desportiva e as Redes Emissoras, referida obrigação quase nunca foi cumprida pelos Clubes, e, conseqüentemente, os atletas deixaram de receber os valores, em evidente desrespeito a lei e aos direitos dos atletas.
Visando resguardar os direitos da sua categoria profissional, alguns Sindicatos de Atletas Profissionais (dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Porto Alegre), ingressaram com uma medida judicial, em 1.997 (antes da edição da Lei Pelé), pleiteando o pagamento de 20% (vinte por cento) sobre os valores negociados pelos Clubes com a Rede Emissora, a título de Direito de Arena, em todos os campeonatos. O processo foi distribuído para a 23ª Vara Cível da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, processo n°. 97.001.141973-5.
Já cabe aqui fazer uma primeira observação que, diferente do que muitos falam, essa foi uma Ação de Cobrança ingressada na Justiça Comum e não na Justiça Trabalhista.
Também vale destacar que referida ação foi proposta no ano de 1.997, anteriormente a legislação vigente, que é datada de 24 de março de 1.998.
Após muita discussão e passados quase três anos de litígio, em 1.999, foi concedida judicialmente a tutela antecipada, na referida ação, determinando a retenção de 20% (vinte por cento) do total negociado, em todos os campeonatos, para o fim de garantir aos atletas profissionais o recebimento de seus direitos, legalmente previstos.
Todavia, em razão da suspensão da decisão, por conta da interposição de inúmeros recursos judiciais, no ano de 2.000, foi firmado acordo entre as partes envolvidas, garantindo aos atletas o repasse de, apenas, 5% (cinco por cento), do valor total negociado e recebido pelos clubes a título de Direito de Arena.
A época do acordo os clubes alegaram que os contratos com as emissoras de televisão não eram exclusivos para as transmissões e/ou retransmissões dos eventos esportivos, sendo que havia 06 (seis) itens negociados, tais como placas de publicidades, utilização dos nomes e símbolos das equipes, valor agregados, dentre outros, sendo que, um desses itens era justamente a transmissão e/ou retransmissão do evento.
Portanto, segundo os clubes, o total a que os jogadores teriam direito pela transmissão e/ou retransmissão da partida seria de 3,3% (três vírgula três por cento), ou seja, apenas a sexta parte do total negociado no contrato.
Todavia, depois de muita discussão, bem como o fato de que todo o valor estava depositado judicialmente, as partes acharam por bem firmar o acordo de 05% (cinco por cento) do total do contrato.
Destaque-se que referido acordo conferiu quitação apenas até o limite do valor recebido, facultando ao atleta a possibilidade de pleitear a diferença que entender cabível, constando expressamente a disposição no referido documento.
Entretanto, os clubes, em virtude do acordo e a revelia da lei, iniciaram um repasse de apenas 5% (cinco por cento) do valor total negociado com as emissoras de televisão, o que gerou todo o imbróglio jurídico que atualmente veio à tona.
É óbvio que se deve enaltecer o feito conquistado pelo Sindicato de Classe. Todavia, referido acordo não confere quitação sobre o total do valor devido de, no mínimo, 20% (vinte por cento), até mesmo pelo fato de que o Sindicato não poderia transacionar em detrimento dos interesses da categoria, pois a Lei garante expressamente o valor, mínimo, de 20% (vinte por cento) sobre o total negociado a título de Direito de Arena.
E mais, também é prudente esclarecer que não existe letra morta na lei, ou seja, toda expressão, frase ou palavra contida em um texto legal tem uma razão para estar lá. Vale lembrar o brocardo jurídico de que “verba cum effectu, sunt accipienda”, ou seja, não se presumem, na lei, palavras mortas. Portanto, a expressão “como mínimo” tem uma função na lei, qual seja, permitir a transação apenas para percentuais superiores ao estipulado em lei, jamais inferiores.
Ademais, cumpre frisar que há um Projeto de Lei (5.186/05) que visa reduzir o percentual para 05% (cinco por cento) pago a título de direito de arena. Mais uma vez vale frisar que se há a necessidade de uma reformulação na legislação, para reduzir esse percentual, é justamente pelo motivo de que o percentual que deve ser praticado hoje é o de 20% (vinte por cento).
Vale aqui trazer uma decisão acerca do tema, que esclarece toda a questão de forma precisa e pontual:
“Entendo que o acordo homologado não se aplica ao presente caso, pois que parte de uma exegese equivocada da Lei 9.615/98, reduzindo significativamente os direitos do reclamante, em evidente prejuízo aos seus interesses, conforme já explicitado acima, atentando contra o principio da irredutibilidade salarial, pois esta é a natureza – já pacificada – do Direito de Arena, bem como contra o par. 1.º do art. 42 da Lei 9.615/98 que estipulou 20% como mínimo.
Tal conclusão pode se verificar da evolução do instituto do Direito de Arena. Tanto na Lei n.º 5.988/73, quanto na Lei 8.672/93 (Lei Zico), a previsão era de 20%, salvo convenção em contrário. Com o advento da Lei 9.615/98, que revogou as anteriores, o legislador expressamente cunhou a seguinte redação no art. 42:
§ 1º. Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço total da autorização como mínimo será distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo ou evento.
Assim, com razão o reclamante, em afirmar que o legislador alterou a redação da Lei, afim de garantir um percentual mínimo aos atletas, pois, caso contrário, não se justificaria a alteração do referido dispositivo.
Por outro lado, o acordo homologado deu quitação até o limite do valor efetivamente recebido, ou seja, 5% do total negociado, ficando amparado o direito dos filiados ao Sindicato (cláusula 8.ª do acordo), em pleitear, em ação autônoma, as diferenças relativas ao Direito de Arena (o que também se depreende dos recibos de fls. 157/160 – que de forma expressa contém a referida ressalva)”[8].
“No entanto, não se pode pretender o reconhecimento da eficácia almejada pela reclamada em razão do acordo em referência. Por primeiro, cabe salientar que este Juízo não tem competência para declarar a nulidade daquele acordo. Porém, pode modular os seus efeitos em relação ao contrato de trabalho do reclamante, visto que existem postulações presentes neste processo que seriam nitidamente afetadas por ele.
Nesse sentido, é oportuno se destacar, em primeiro lugar, que o fato apresentado é, realmente, sui generis. Isso porque, não se poderia jamais admitir um acordo da natureza daquele celebrado pelos representantes patronais e pelo sindicato da categoria de trabalhadores. Com efeito, a indisponibilidade de direitos trabalhistas pelo empregado constitui-se em regra geral do Direito Individual do Trabalho pátrio, estando subjacente a pelo menos três relevantes dispositivos celetistas: artigos 9º, 444 e 468, CLT. O trabalhador, quer por ato individual/unilateral (renúncia: despojamento sem reciprocidade), quer por ato bilateral (transação: concessões recíprocas ante a res dubia), não pode dispor de seus direitos laborais, sendo nulo o ato de despojamento. A incidir os princípios da indisponibilidade de direitos trabalhistas e o princípio da imperatividade da legislação do trabalho.
Disso decorre que os trabalhadores e principalmente os sindicatos – a quem competia a defesa dos interesses da categoria – não poderiam transacionar a diminuição significativa do direito previsto no parágrafo primeiro, do artigo 42 da Lei 9.615/98. Ao contrário do que propugnam os adeptos do liberalismo revisitado e do que alega a reclamada, o sindicato não possui autonomia suficiente para transacionar quaisquer tipos de direitos e muito menos para precarizar os direitos dos trabalhadores. Note-se que o propalado “acordo” representou nada mais do que a diminuição significativa do percentual repassado aos jogadores do Direito de Arena e em troca de absolutamente nada! Ora, mesmo nas relações tipicamente privadas, qualquer transação pressupõe a concessão recíproca de direitos duvidosos ou litigiosos. No caso em tela, além de não haver nenhuma reciprocidade no dito “acordo”, os direitos sobres os quais versaram não eram duvidosos e muito menos litigiosos. Apesar disso, é de se ressaltar que restou ressalvado no bojo do “acordo”, em sua cláusula 8ª, a possibilidade dos atletas filiados pleitearem, em ação autônoma, as diferenças que entenderem cabíveis em relação ao Direito de Arena.
Nesta esteira, afasto a incidência do acordo celebrado no caso em exame para fins de supressão da parcela ora postulada. Por conseqüência, conforme pedido inicial, defiro ao reclamante o pagamento do percentual mínimo de 20% sobre o total negociado com a Rede Globo de Televisão pela autorização de transmissão do Campeonato Brasileiro da Série B de 2009.
Diante do caráter salarial da parcela e com amparo no artigo 457, parágrafo 1°, da CLT, defiro a integração do valor auferido a título de Direito de Arena, na remuneração do atleta para todos os efeitos legais, condenando a reclamada a pagar as diferenças de DSR, FGTS, 13º salário e férias com um terço do período”[9].
Conclusão:
Nota-se que o imbróglio formado acerca do direito de arena reside quanto a sua natureza jurídica (indenizatória ou remuneratória), bem como ao percentual que deve ser pago aos atletas (5% ou 20%).
Por tudo o que foi traçado aqui, podemos concluir que o Direito de Arena em nada se confunde com o Direito de Imagem, por se tratar de institutos completamente diferentes, sendo que, diante desta dissociação, sua natureza é puramente remuneratória, jamais podendo ser indenizatória.
Os Tribunais pátrios, quase que em sua totalidade, têm adotado o entendimento de que direito de arena e direito de imagem são institutos distintos, sendo o primeiro de natureza remuneratória e o segundo indenizatória, desde que não tenha o condão de fraudar a lei.
A outra controvérsia consiste no valor que deve ser repassado aos atletas, protagonistas do espetáculo desportivo.
Quando se fala nesses percentuais, verifica-se que os 05% (cinco pro cento) adotado pelos clubes estão em desacordo com a legislação, que prevê um mínimo de 20% (vinte por cento) aos atletas.
Além de o dispositivo legal ser bastante claro e objetivo, há o embasamento pautado nos princípio que regem o direito brasileiro, dando ênfase a irrenunciabilidade do salário garantida aos trabalhadores.
[1] ZAINAGHI, Domingos Sávio. Os atletas Profissional de Futebol no Direito do Trabalho. Ed. São Paulo: LTr, 1999. p. 145
[2] CHAVES, Antonio. Direitos conecosa: atualizado de acordo com a nvoa Lei de Direitos Autorais, nº 9.610, de 19 de feveriero de 1998, São Paulo: LTr, 1999, p. 129
[3] SILVA, Eduardo Augusto Viana da. O poder, a sociedade e o Estado: o poder no desporto. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 145
[4] FILHO, Álvaro Melo. O desporto na Ordem Jurídica Constitucional Brasileira. São Paulo: Malheiros Editores, 1995, p. 41
[5] REsp 46420/SP, (199400093551, 78025 Recurso Especial, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, data da decisão: 12.09.1994)
[6] ZAINAGHI, Domingos Sávio, Os Atletas Profissionais de Futebol no Direito do Trabalho”, L Tr, 1998, p. 147-148
[7] Tribunal Superior do Trabalho, 3ª Turma. AIRR 940/2002-004-03-40, DJ 18/02/2005, Rel. Des. Dora Maria da Costa)
[8] Processo nº 01712-2008-090-02-00-6, ação proposta por Leon Dario Muños Hernandez contra a Sociedade Esportiva Palmeiras, em curso perante a 90ª Vara do Trabalho de São Paulo.
[9] Processo nº 0000866-17.2010.5.15.0001, ação proposta por Weimar Marcos Rodrigues x Guarani Futebol Clube, em curso perante a 1ª Vara do Trabalho de Campinas/SP.






































































































































